quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Café com leite

O título parece bem inocente: “Café com leite”. Mas logo no início do filme nos deparamos com assunto de gente grande. E não estou me referindo a cena inicial em que dois rapazes seminus acordam juntos aos beijos e afagos. É bem verdade que à primeira vista existe um choque perceptível na platéia mais desavisada, ocasionando, inclusive, a saída antecipada dos indivíduos mais “pudicos”, como aconteceu no Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo, onde algumas pessoas saíram da sala logo no início do filme. Felizmente, o mesmo não aconteceu durante a sua exibição na 3ª Mostra Cinema e Direitos Humanos na América do Sul, realizado em Fortaleza. Quando me refiro à seriedade do conteúdo estou me reportando a abordagem que se faz quanto à fragilidade de uma relação familiar onde o “morar junto” não significa exatamente “conviver com”. Daniel Ribeiro retrata as dificuldades de um relacionamento familiar onde dois irmãos, Danilo (Daniel Tavares) e Lucas (Eduardo Melo), mesmo morando sob o mesmo teto, somente passam a se conhecer de verdade depois da morte dos pais. A opção sexual do irmão mais velho, que namora Marcos (Diego Torraca), não é necessariamente o foco da fictícia história. A troca do seu sonho de desfrutar a liberdade nos braços do amante pelos cuidados com o irmão mais novo é o ponto alto da trama. Claro que essa relação não dá pra passar desapercebida, mas o que chama mesmo a atenção é a descoberta que os irmãos têm um do outro, estabelecendo-se um laço de afetividade que ambos não conheciam. “Café com leite” não está preocupado em fazer apologia à diversidade sexual nem tampouco abordar o preconceito social com relação ao amor entre dois homens, mas expõe, de forma sensata e com pitadas de bom-humor, um cotidiano que envolve e ao mesmo tempo emociona o expectador, que fica imaginando o rumo que o diretor dará aos personagens. Talvez por essa leveza, não estranhemos a presença de uma criança no meio desse relacionamento “pouco ortodoxo”. Na verdade, o garotinho constitui-se em uma peça fundamental no texto de Daniel Ribeiro, alternando momentos de carência (quando quer chamar a atenção de Danilo), e maturidade (no trato com o namorado do irmão). Dentre as muitas premiações quer já conquistou, Café com Leite foi eleito o melhor curta da mostra Geração, dedicada a filmes que tenham crianças ou adolescentes como personagens principais, ganhando o Urso de Cristal no Festival Internacional de Cinema de Berlim, na mesma ocasião em que Tropa de Elite recebeu o prêmio máximo, o Urso de Ouro. Depois vieram os prêmios em Torimo, Miami, e em outros tantos festivais nacionais e internacionais. Acredito que o sucesso do filme consiste na simplicidade com que foi idealizado, sem muitas pretensões, como frisou o autor em entrevista após a premiação em Berlim, mas ao mesmo tempo com a emoção necessária ao encantamento do público.

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